22.2.10

Bernardo Soares

“Eu não possuo o meu corpo. Como posso eu possuir com ele? Eu não possuo a minha alma. Como posso possuir com ela? Possui alguém o rio que passa? Possui alguém o vento que passa? Possuímos nós alguma coisa? Se nós não sabemos o que somos, como sabemos nós o que possuímos?”
 Bernardo Soares 

Vazio

"Chorei três horas, depois dormi dois dias.Parece incrível ainda estar vivo quando já não se acredita em mais nada. Olhar, quando já não se acredita no que se vê. E não sentir dor nem medo porque atingiram seu limite. E não ter nada além deste amplo vazio que poderei preencher como quiser ou deixá-lo assim, sozinho em si mesmo, completo, total."

Caio Fernando Abreu

21.2.10

Poema da devastação

Há uma devastação
nas coisas e nos seres,
como se algum vulcão
abrisse as sobrancelhas
e ali, sobre esse chão,
pousassem as inteiras
angústias, solidões,
passados desesperos
e toda a condição
de homem sem soleira,
ventura tão curta,
punição extrema.

Há uma devastação
nas águas e nos seres;
os peixes, com seus viços,
revolvem-se no umbigo
deste vulcão de escamas.

Há uma devastação
nas plantas e nos seres;
o homem recurvado
com a pálpebra nos joelhos.
As lavas soprarão,
enquanto nós vivemos.

Carlos Nejar